terça-feira, 27 de maio de 2008

Histórias de camisinha, Moacyr Scliar




No século 16 uma epidemia de sífilis espalhou-se pela Europa. Não havia tratamento eficaz; usava-se o mercúrio, que matava o micróbio mas, sumamente tóxico, deixava o paciente em petição de miséria. E isso gerava uma dúvida crucial: seria possível evitar a sífilis, mas sem evitar o sexo?
A resposta foi dada pelo grande anatomista italiano Falópio (que descreveu, a propósito, as trompas de Falópio). Num trabalho publicado em 1564 — póstumo; ele morrera dois anos antes —, Falópio diz que os não-circuncisos podiam se proteger da infecção colocando um pedaço de pano sobre a glande e fixando-o com o prepúcio. Na verdade, uma manobra muito pouco prática e nada garantida. Contudo, é a Falópio que se atribui a descoberta do condom, embora uma lenda diga que os romanos já usavam, com o mesmo propósito, bexigas de bode.
A idéia pegou, mas na linha dos romanos, não de Falópio. Dois séculos depois, preservativos já estavam disponíveis, feitos de pele de peixe. O objetivo agora não era só evitar a sífilis, mas também a gravidez. Nas palavras do galante Casanova: “É preciso colocar o sexo ao abrigo de qualquer medo”. As camisinhas eram vendidas em bordéis e em alguns estabelecimentos comerciais, sendo especialmente recomendadas, segundo um anúncio da época, para “cavalheiros, embaixadores e capitães de navio viajando para o estrangeiro”. A camisinha era então um objeto sofisticado; os militares ingleses, por exemplo, usavam-nas decoradas com as cores de seu regimento. Mais tarde, o retrato da Rainha Vitória (que não era exatamente um tipo de beleza) apareceria nas caixinhas dos preservativos: homenagem à realeza ou um breve contra a luxúria? Nunca ficou esclarecido.
A camisinha era muito cara. Mas então a tecnologia veio em socorro dos aflitos amantes. Com a descoberta da vulcanização da borracha, em 1843-1844, tornou-se possível fabricar um condom mais barato e apropriado. A partir daí o uso se propagou. Os antibióticos, que foram um grande avanço na luta contra as doenças sexualmente transmissíveis, levaram também a um certo descaso com a prevenção — que voltou a ser valorizada com a corrente epidemia de Aids.
Mesmo assim ainda existem muitos obstáculos ao uso do condom. Um médico tailandês que encontrei num simpósio de saúde pública contou-me uma história muito ilustrativa. Para mostrar aos camponeses da região como usar o preservativo, ele colocava um no próprio polegar. Um dia veio ao posto de saúde um camponês furioso: ao contrário do que o médico dissera, sua esposa havia engravidado. O doutor perguntou como tinha usado o preservativo. No dedo, como o senhor mostrou, foi a resposta.
O nosso nível de informação é maior, mas mesmo assim, o condom ainda precisa ser mais difundido. Não é preciso chegar aos exageros como aquele que vi em uma camiseta: “Machão não usa camisinha; machão manda plastificar”. Mas é preciso, sim, lembrar que sexo seguro não é sexo amedrontado. Sexo seguro é, simplesmente, sexo informado.

Um comentário:

Jackson disse...

Ahahahaha. O camponês foi legal ahahahahahaha.